segunda-feira, 1 de julho de 2013

APOSTASIA INVOLUNTÁRIA

                                                                   SEGUNDO SEMESTRE DE 1967


                              Durante as férias de julho deste ano, o Padre Agostinho deu-me uma notícia alvissareira em forma de promessa, pois ele não tinha absoluta certeza se conseguiria uma ajuda de custo para mim. Apenas confidenciou-me que no início de agosto viajaria à São Paulo para tratar de assuntos particulares e tentaria conseguir um (a) benfeitor (a). Como os meus pais não estavam presentes durante as minhas férias, tive regressar ao seminário precisando de alguns materiais escolares e pessoais.
                             Passei a rezar muito para que Deus o ajudasse neste objetivo e no final de agosto recebi um telegrama que me trouxe uma ótima notícia. No mesmo estava escrito assim:

                      RECEBA BANCO DO BRASIL CINQUENTA CRUZEIROS

                                               Remetente: YOLANDA NERY SOUSA ESTRELA

                           Ao constatar que o remetente era de Santos - SP logo deduzi que se tratava da benfeitora que o meu vigário me prometera. Fiquei tão emocionado e ao mesmo tempo grato que fui mostrá-lo ao reitor do seminário. Neste momento tive a certeza de uma grande verdade: Nem tudo que reluz é ouro, mas que o ouro altera o comportamento de determinadas pessoas isto é fora de qualquer dúvida. Uma explicação para melhor entendimento neste meu ponto de vista: Sempre que eu procurava o reitor era para, sem dúvida, pedir alguma coisa, principalmente algum dinheiro para suprir uma necessidade pessoal. E era sempre recebido de maneira fria, indiferente e com o semblante carrancudo como se dissesse: lá vem este seminarista pedir dinheiro novamente. Só que desta vez, se este pensamento passou pela sua cabeça, logo foi dissipado tão logo lhe mostrei o telegrama que acabara de receber. Ao constatar o conteúdo, logo abriu o sorriso interesseiro e deu uma de João sem braços, perguntando:
        
                      -"O que significa isto? Quem é esta Yolanda, é a sua mãe?"

                      -Não senhor. Eu não a conheço. Mas o meu vigário me prometeu durante as minhas férias que tentaria encontrar uma pessoa generosa em São Paulo que pudesse me ajudar. E esta Dona Yolanda é a benfeitora que ele contatou.

                     - Muito bem. O importante é que você tem um bom dinheiro no Banco do Brasil! Isto é muito bom. Dá para saldar sua dívida e ainda sobra um pouco...
                    - Espero que sim, Monsenhor. Pois preciso comprar urgente material escolar, um par de sapatos e uma muda de roupa, pelo menos.
                    -É, mas pelo visto você não pode receber este dinheiro sozinho pois não tem ainda dezoito anos. Vou providenciar uma procuração para que o motorista do seminário o acompanhe até ao Banco e recebe esta quantia. Agora se der algum problema eu mesmo irei lá e peço para fazer uma transferência para a conta do seminário ou a minha. Estamos entendido?
                 -O que o senhor fizer estará bem feito - finalizei assim a nossa conversa para não criar nenhum problema, mesmo já prevendo que daqueles cinquenta cruzeiros eu não poderia usar nem a metade.
                 Foi dito e feito. Ele simplesmente me deu alguns trocados para comprar o que eu falei e depois já definiu para a minha surpresa:
                -Olha aqui, presta atenção, dinheiro agora só quando a sua benfeitora depositar outra quantia igual a esta ou maior, entendeu?
               -Seja o que Deus quiser, reitor.
                E esta transação chegou ao fim para minha grande decepção. Só que Deus sabe o que faz. Afinal alguém já afirmou com muita propriedade: "Se sofres injustiça, cala-te. A verdadeira desgraça é cometê-las"

                                Próxima postagem: Continuação do segundo semestre de 1967

0 comentários: