Só que o progresso em todos os sentidos tem seu lado positivo e negativo. Num ponto facilita a vida em geral das pessoas, exigindo mais rapidez de aprendizagem e por outro vai excluindo e deixando para trás todos aqueles que não se dispuserem a acompanhar o tal avanço da tecnologia. Pois a inércia, a preguiça, a ausência de objetivos e mais alguma coisa só corroboram para postergar a concretização dos ideais de todas as pessoas jovens.
Em meio a esta discrepância de atividades intelectuais, o meu pensamento volta diretamente ao trabalho árduo que o meu velho pai, que Deus o tenha, executava com responsabilidade e coragem para sustentar a nossa grande família. E foi quando acompanhei de perto o serviço do pedreiro (meu pai também o era) na reforma do meu apartamento, que repentinamente surgiu uma lembrança paterna. Pois o mesmo com uma perna torta, por motivo de um acidente de trabalho, sempre procurou honrar com a sua palavra e acima de tudo, responsabilidade.
Naquele tempo, na década de 60, lá na nossa pacata cidade, com pouco dinheiro em circulação, a nossa família tinha por hábito comprar fiado em alguma mercearia ou empório,mediante anotações numa caderneta e cujo pagamento era efetuado, aos poucos no final de cada mês ou antes, dependendo do serviço que o meu pai arrumava. E foi neste ínterim que me veio a lembrança de um fato que ocorreu com ele quando executava o serviço de uma calçada no empório onde, por conincidência o meu pai tinha dívida. Combinou o preço e antes de mais nada o formato, o estilo da obra e começou a trabalhar com afinco. Então, diarimente, eu ia levar o almoço ao meu velho pai, evitando o transtorno de descer e subir ladeiras em pleno sol do meio dia.
E quando estava no término do serviço, por sinal no último dia, presenciei uma cena que jamais esquecerei. Vi o dono do empório chegar para averiguar o serviço e foi logo falando alto e com empáfia de uma pessoa ignorante:
-"Seu Manuel, não quero esta calçada desse jeito, não. Pode desmanchar esta parte aqui e fazer novamente!"
Enquanto ele falava, o meu pai só ouvia calado e quando o dono ia saindo, achando que a sua ridícula ordem ira ser obedecia, ficou boquiaberto com a resposta do velho pedreiro:
-"Olha aqui, seu Gomes, fique sabendo que aqui não tem nenhum moleque não. Nunca desmanchei e jamais vou desmanchar um serviço meu. O senhor quer uma calçada diferente? Pois contrate outro pedreiro. Quanto o meu serviço, pode descontar na minha dívida e ponto final e durma em paz, se for capaz!"
Em seguida pegou no meu braço e voltamos para a nossa casa. E no caminho, de vez em quando, murmurava um solilóquio mais ou menos assim: "Tá pensando o quê! Eu sei o que faço e tenho responsabilidade! Não sou moleque para ninguém me chamar a atenção!"
Valeu, meu velho pai!
João Bosco de Andrade Araújo
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