quarta-feira, 29 de abril de 2009

O CAMBISTA E A TELEFONISTA

Pelo título, pode-se pensar que se trata de algum filme, livro ou até mesmo algum romance qualquer da periferia. Mas não é nada disso. Essas duas pessoas, cujas atividades completamente diferentes, pelo menos, durante o dia elas têm algo em comum: entediarem-se com alguém que cruza os seus caminhos. Explico: é aquele de pessoa desprovida de bom-senso que “torra” a paciência de qualquer um quando pega para “Cristo”. Vamos aos fatos:
No caso do cambista, um senhor desempregado, aguardando a sua aposentadoria minguada e engavetada, durante o seu expediente na sua pequena e humilde banca, de tanto fazer sempre algo repetitivo, antecipadamente quando um (a) freguês (a) se aproxima ele até já sabe, além do palpite para o jogo, o papo que vai rolar. Então, por mera educação, ouve tudo novamente e, amiúde, faz algum comentário só para dar entender que está ligado no assunto ilógico. São os ossos do ofício!. Nesse ínterim, sempre tem alguma pessoa que parece ter um enorme prazer em consumir a paciência do pobre cambista! Mas, foi num momento assim que ele não aguentou um tremendo papo-furado e desabafou:
-“Sem querer humilhar, menosprezar, sinto muito, mas faço questão de lhe dar cinquenta centavos por semana para o senhor não vir aqui me azucrinar e encher a minha paciência!”
A sugestão parece que foi aceita. Pois aquele senhor nunca mais foi visto por ali. E segundo as notícias que correram é que ele, por coincidência ou não, aquele senhor havia falecido. E foi aí que certo dia, ao tocar nesse assunto de pessoas que torram a paciência de qualquer um com o mesmo papo diariamente, que o cambista desabafou novamente:
-“Sabe, aquele senhor que me importunava diariamente com a mesma ladainha e, num momento de descontrole emocional, prometi ao mesmo uma pequena quantia para ele não fazer mais isso?
- Ah, ele morreu faz um tempinho! - falou alguém. Você agora está livre, não é verdade?
- “Você é que pensa! Livre aqui na banca. Mas só Deus sabe o que já passei quando estou dormindo! Já tive até pesadelos com ele, rapaz! É a vida!
-É nada, é a morte! Cuidado!
Quanto a telefonista, o seu sufoco diário acontecia todas as vezes em que ela se encontrava com uma pessoa que trabalhava na mesma firma e já ciente que precisava de alguém para “alugar” os ouvidos, a dita cuja certo dia falou:
-“Pode deixar, eu pago a sua condução!”
A telefonista não recusou. Mas já sabia que durante toda a viagem do seu bairro até o centro da cidade, ou seja, em mais de uma hora os seus ouvidos seriam abarrotados de “abobrinhas” e fofocas. Mas, fazer o quê? Mas quando comentou esse fato lá na firma, algumas colegas, já conhecendo a fama daquela que falava pelos cotovelos, não deixaram por menos:
- Ah, fulana faz questão de pagar a condução de qualquer um é só para ter o prazer de ter alguém para desabafar, ou seja, paga o aluguel dos ouvidos daquela pessoa!
A partir desse dia, a telefonista passou a se esquivar daquela colega de firma, mas de vez em quando não tinha jeito. Havia alguma coincidência e as duas viajavam juntas. Uma falando, comentando, criticando, fofocando, enquanto a outra ouvia resignada e, amiúde, fazendo pequenos comentários, assim como aquele cambista.
Pensando bem, o ser humano é mesmo muito enigmático. E ai de quem quiser entender um pouquinho desse mistério!


João Bosco de Andrade Araújo

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